quinta-feira, 18 de setembro de 2014

Não é nada de mais


Era minha vez de colocar nonada no papel, a coisa de pouca monta, É o que venho apresentar. Vale dizer, que as ideias aqui, embora começadas no meio do nada, não implicam necessariamente, em um texto inédito. A título de exercício literário, imagine que o lido já existia. E você o conhecia antes mesmo da leitura começar. A declaração em primeira pessoa, nas próximas linhas, não tem compromisso com a totalidade do texto.
Talvez seja só conversa fora jogada no papel ou, quem sabe, não passe de um trecho inicial sobre um poeta, um conhecido lisboeta. Pode ser também a vontade do narrador, querendo ser ele esse autor. Agora uma pequena advertência. Não vá confundir O Pessoa do narrador com o sujeito do autor. Ao longo do texto, Surgem àquelas falas aparentemente ingênuas e de novo as vozes reflexivas da narrativa. Então que comece o texto: - Eu queria ser O Fernando Pessoa, queria sim, verdade, só não sabia ainda. Isso ficou claro depois da aula de literatura. Não me recordo qual foi o poema lido, sei que era do Pessoa. Mas foi algo tão contagiante que me senti invadido e fascinado por aquela criação literária. Hoje eu não quero mais ser O Pessoa. Descobri que não há jeito de ser. Só posso mesmo, ser quem eu sou. E acredite, já é muito, tenho certeza que é. Com o passar do tempo a única solução foi virar um adulto. E adultos, pra quem não conhece, são aquelas pessoas que vem depois das crianças. Comumente, denominam-se ‘pessoas maduras’. Mas apesar ter me tornado uma dessas maduras, ainda resmungo no quarto uma esperança verde e imatura: e se eu fosse ele? Como seria? Não sei. Em todo caso, deve ser por isso, que daí em diante passei a escrever de um jeito estranho, mas sempre pensando nas coisas que leio, não com intuito de copiar. É que, não raro, durante a leitura fico pensando. Será por isso que escuto uma voz cansada? A voz de um velhinho. Ele, com uma paciência de Jó, lê os textos para mim. Na verdade, o velho, mora aqui dentro e tem por companhia uma criança feliz. Ela está sempre ali, de plantão, a fazer travessuras quando estou bravo ou serio demais. Outro dia, distraído, eu estava a consultar um sábio mirim, uns desses, bastante experiente que vem de longas fraldas atrás. Acho que tem entre 4 e 5 anos. Eu perguntei a ele o que era necessário para uma pessoa ser boa. O sábio pensou e respondeu com aquela graciosidade peculiar das crianças: “pra ser uma pessoa legal, é preciso sempre sorrir um sorriso alegre e não sorrir um sorriso sorrindo das pessoas.” Fiquei pensativo com a resposta, primeiro pareceu-me ingênua, mas depois, refletindo um pouco mais vi que não era. Ao contrário, pude perceber a poesia e a profundidade. Em poucas palavras, falou-me de ironia e respeito aos sentimentos dos outros. Sinceramente eu queria ter dito isso. Mas essa inocência a muito me deixou. Sou apenas um escravo de coisas belas assim. Não sei como as dizer. No máximo, são escritas pela minha pessoa. É difícil retornar a terra do nunca ou ao mundo da fantasia. Para isso, exige-se paciência e tempo, tempo para não gastar, coisa que os adultos perdulários do tempo, quase não têm, pois, gastam todo o seu tempo em rotinas apressadas. Eu, na minha insubordinação, escrevo, mas escrevo só o que quero escrever, mesmo assim é muito a pulso que às palavras saem. A dificuldade em expressar o que pulsa, advém dos sentimentos, eles são movediços e tão dinâmicos. Quando dou por mim, veja só, já foi, voltou, depois vai e volta de novo e nessas idas e vindas. Acho que a coisa nunca saiu do lugar. Em todo caso, vou labutar de novo uma nova escrita. Consegui congelar um pensamento, antes que ele vá embora ou derreta de vez, vou lhe mostrar o que sei. Caso não venha ser a tarefa cumprida, não será inglória, será ao menos, a coisa mostrada e tentada. Eu queria, desde o início, somente retratar uma voz apaixonada existente em todos os textos que leio e talvez alguns lidos por você também. Principalmente nos livros com aqueles números de páginas todas. Sabe daquela história? Aquela? Ela pulsa, pulsa, implora, pede para ser lida. E antes mesmo de acabar, perto do seu final. Consegue deixar no leitor um sentimento triste e pensativo. Algo assim: e agora? Como fico? O que vou ler? Existe outra voz, uma voz que acredito seja pior ainda. Ela se ocupa de questões metafísicas. Absurdamente só gosta de ler os livros que não foram ainda inventados ou mesmo rascunhados. Esses me inquietam, pois, parecem gritar pedindo passagem para existir. Na verdade, acho que é só pensamento mesmo. Em todo caso, sobre eles, pode-se dizer apenas que não tem ainda um começo definido e o miolo, a parte do meio, parece indefinida. Acho que não há como saber do que tratam. Em meio a tantas incertezas, a despeito de livros iniventados, pelo menos há um consolo, falta-lhes um acabamento final o que não é de todo ruim, livros sem fim, representam o infinito das ideias, o gerúndio da imaginação. Esses manuscritos não escritos são coisas que podem existir em qualquer lugar ou pessoa da maneira que bem quiser, pois nunca deixam de existir.            
      Ernandes de Oliveira

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